Eu tive um Blogue no Sol
Algures no inicio do seculo XXI , depois de uma grande desilução com a vida, abri um blogue num jornal . No jornal Sol .
Chamava-se In.justiças.
Não entendia nada daquilo. Não sabia o que era um blogue , só adorava escrever e um dia durante uma longa noite decidi abrir um blogue. De repente , alguem chamado “makejetomosso” me deu as boas vindas…E apartir daí parecia um grupo de vizinhos americanos ( pois cá isso não se usa , infelizmente ) a me acolherem e a seguirem o meu blogue .
Fiquei em pânico. O que eu pensei ser algo anónimo , de repente tornou-se algo que eu cuidava com todo o carinho, pois não queria desiludir os meus “vizinhos”.
Esse blogue tornou-se a janela aberta para um novo mundo. No meio do trabalho, filhos, vida domestica e empresarial , tinha encontrado um local aonde poderia desabafar as justiças e injustiças deste mundo e aprender imenso com os meus vizinhos.
Recordo que o meu primeiro post foi sobre o desaparecimento do meu sobrinho…Rafael tinha 11 anos e tinha falecido.
Estava revoltada .
Os anos seguintes foram uma sucessão de acontecimentos que me marcaram e foi ali, em frente ao ecrã e escrevendo o que me ia na alma que eu me “curei” da revolta .
Devagar, as pessoas que escreviam naquela plataforma foram se tornando um grupo coeso . Faziamos jantares, encontros de bloggers e conheci imensas pessoas inacreditaveis .
Todos tão diferentes nas suas vidas pessoais , laborais , politicas e sociais.
Tão diferentes!
Tinhamos o engenheiro que nos ajudava na plataforma e escrevia sobre tudo com uma facilidade e capacidade de escritor, o professor que nos convidava para as vindimas no Norte , a portuguesa a viver na Holanda que escrevia sobre erotismo, a professora de ensino especial que nos falava de politica e das suas crianças , a inteligente mulher ligada a navios que escrevia extraordinariamente bem e nos encantava , a borboleta linda que escrevia sobre a alma, o inteligente homem que trabalhava para o estado e escrevia melhor que muitos escritores, textos cheios de humor e sedução , a minha “irmã” brasileira que escrevia sobre a alma ao som do sotaque Brasileiro, o engatatão que no fundo era um intelectual introvertido , a lindissima senhora pintora , escritora que nos fascinava com os seus 80 anos e hoje com 92 continua a ser a minha amiga de coração, o brincalhão que gozava com os politicos e outros tantos, tantos !
E o camionista…
Devagar todos saimos e fomos para o Facebook…Era a novidade , era facil , era intuitivo e pela primeira vez aqueles que não se conheciam viam os rostos das pessoas com quem falaram durante anos .
Posso dizer que eramos um grupo , uma comunidade que nunca se perdeu. Saimos de um local aonde nos sentiamos a mais pelos “donos do terreno” e fomos “cultivar” para outras terras.
Não falamos todos os dias, mas vamos seguindo a vida uns dos outros no Facebook.
Ontem vi um comentario de um amigo e fui ver o post .
Tive que ler duas vezes para entender.
Um de nós tinha partido…
O camionista.
Era assim que se chamava o seu blogue pois ele era camionista . Mas era mais que isso. Mais uma vez , este grupo de pessoas tão heterogêneo nos provou a nós e ao mundo, que não devemos rotular as pessoas pela sua profissão, roupa, estatuto ou educação .
O Luis, era camionista sim. Mas mais culto que eu ou qualquer um do nosso grupo. Escrevia extraordinariamente bem. Escrevia as suas historias do dia a dia, como se tivesse nascido a faze-lo , fotografava como um fotografo profissional e discutia todos os temas connosco como se passasse o seu dia entre os intelectuais do país.
Segui sempre o seu blogue já fora do Sol e o que escrevia no facebook. Ele tambem fez o mesmo com este blogue . Era alguem longe , mas perto de todos nós através da sua escrita.
Este era o Camionista .
Não sei quanto tempo os seus escritos estarão neste mundo virtual…
Mas sei que para todos nós, que de uma forma ou outra se deliciaram com a sua escrita , as suas ideias e ideais , com as suas fotos, estará para sempre nos nossos corações.
Até um dia …
A estrada da vida irá continuar . A estrada dele irá continuar num outro patamar , pois eu acredito que os “camionistas” desta vida podem ter estradas cortadas, mas o seu caminho continuará em outras estradas, ainda desconhecidas .